sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Para 2017

Tenho 48 anos, dois filhos, dois cachorros e muita vontade de  viver.  Alguns fracassos, alguns sucessos e bastante tempo pela frente,  o que me faz refletir  e escrever. O que quero pra mim? O que quero para as minhas relações? É  possível apenas deixar fluir?  A felicidade se busca e se constrói  ou apenas se recebe, quando somos merecedores? O que é  a vida e o que fazemos dela? Como me encontro agora? O que quero? O que busco? O que almejo? Estou feliz nessa busca? O que me falta?
Eu não tenho nenhuma resposta, mas tenho a certeza de que o tempo de reflexão  é  agora.
Fim de ano e dias de arrumações,  externas e internas, e limpezas.  Quero estar bem. Com espaços.  Aberta. Confiante. Eu estou bem. Estou feliz. Estou com  saúde  e vencedora. Hoje eu enxergo melhor. Hoje eu me sinto feliz. Posso, realmente, desejar um feliz ano novo!  Para os meus, para mim,  para os que me rodeiam e para os que quero atrair. Um feliz ano novo! Hoje já está ótimo! Quero arregaçar  as mangas! Tenho muito a fazer!
Vem, 2017!

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Cinza-chumbo

O céu está cinza-chumbo e chove no Mestre Álvaro, posso ver.
A par disso, problemas para resolver e algumas dores no coração.
Mas não importa.
Em dias como o de hoje, em que o cheiro de maresia se espalha pelo ar, feito um perfume, nenhum peso é pesado!
Caminho pelo cinza-chumbo, atravessando meu olhar para dentro.
Quanto mais eu olho ao longe, mais dentro de mim me encontro.
E se alguém me vir na rua ou mesmo me chamar, verá que flutuo absorta em pensamentos íntimos, que me são caros.
Volto ao passado, projeto o futuro, planejo o presente.
Tudo ao mesmo tempo, com os três planos se intercalando.
Acho que por isso confundo o que está para acontecer com o que já aconteceu.
Vivo tudo duas ou três vezes e mesmo assim nunca sei ao certo.
O chumbo.
A chuva.
A maresia.
E a vida invadindo os sonhos.

Preciso controlar a respiração para ter calma.
Preciso ter calma para controlar a vida.

Preciso mesmo controlar a vida?






quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Se o meu amor soubesse...


Se o meu amor soubesse o quanto eu o quero, faria diferença?
Ah!, meu querido, se eu pudesse, curaria tuas feridas por interesse próprio.

Quero beijar teus olhos, para você me ver com amor,
Quero beijar teus lábios, para que tuas palavras sejam doces comigo,
Quero beijar tuas mãos, para que você caminhe ao meu lado,
Quero beijar o teu peito, para que o teu coração se acalme,
Quero beijar teus cabelos, para que teus pensamentos fluam em direção a mim.

Se eu pudesse, com um abraço te protegia todo.
Faria você dar três voltas com os olhos vendados e, tirada a venda, te diria:
Segue! Segue o teu caminho em direção a mim, te espero faz tempo.
Estou de braços abertos te esperando.
Segue! Segue firme!
Confia em você, pois eu confio em mim e eu confio em nós.

Ah!, meu amor, você não vê que minha mão está estendida, esperando a tua?
Que meus olhos querem pousar nos teus?
Que meus beijos são todos teus?
Que se eu pudesse, moraria no teu sorriso?
Ah!, meu amor, vai ser bom, embora eu não possa prometer que seja para sempre!
Confia!

Ah!, se o meu amor soubesse, faria diferença?


sábado, 29 de outubro de 2016

Mar

Eu mergulhei no mar.
De cabeça.
Sozinha.
Por vontade própria.
Achei, como de costume, que só iria molhar as pontinhas dos pés.
Mas quando me vi, já estava inteira, no fundo, mergulhando e gostando.

Nunca desejei entrar no mar desse jeito. Tinha medo, até.
Mas agora, é um desafio, é para sempre, é vital.
E me faz falta.

O mar, sempre o mar!, assusta.
É imprevisível.
É instável.
É indecifrável.
Às vezes bravo, às vezes doce, às vezes me ignorando, às vezes flertando comigo.

E eu por tantos anos me escondi, fugi, fiquei só de fora, olhando.
Olhando e desejando.
Olhando e não acreditando que eu seria capaz.

Mas agora, não sei o que houve, eu criei coragem, 
Eu quis enfrentar os meus mais profundos medos, 
Eu quis fazer algo diferente, eu quis fazer algo por mim.
Então, não tão rápido assim, não sem hesitar, não sem dar umas braçadas erradas, eu fui.

Eu mergulhei no mar.
De cabeça.
Sozinha.
Por vontade própria.

E, apesar do medo, estou com coragem. 
Pode parecer um paradoxo, mas ambos residem em mim.
São sentimentos diferentes, velhos amigos de mãos dadas, que zombam de mim, 
que me acompanham em tudo o que faço e que me movem.

O medo me faz ter cautela.
A coragem me impulsiona.

E quando me proponho a ir mais além, 
a tentar buscar o fim daquela raia e me apavoro pelo medo, na ida,
Na volta, eu me encho de coragem e dou o melhor de mim, 
acreditando que é um ensaio de uma nova tentativa e que sairei vencedora.

E assim construo o meu exercício.
E assim percorro as raias, braçadas leves, lentas, 
deslizando naquela superfície tão rígida para mim, por ser novidade, 
mas tão fluida, refrescante, prazerosa.
E assim vou aprendendo a respirar. 
Respirar para me deslocar nesse meio diferente.
Respirar porque sou peixes, 
e  quero que o mar seja minha casa.

Depois de muito tempo,
Eu quis entrar por vontade própria.
E assim é no mar.
E assim é no amor.
E assim é na vida.
E eu quis entrar, de cabeça.


quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Aprendizagem com o vento

Sempre caminhei rápido  e firme,
Mas hoje resolvi caminhar com calma.
No mesmo calçadão  em que corro pelas manhãs,
Desfilo à noite, em passos calmos.
Calmos, mas firmes.
Decididos.
Hoje à  noite ventava muito. Muitos nós.
Enquanto  meu corpo vencia o vento,
Que passava arejando meus pensamentos,
Meu caminhar era compassado com os meus planos.
Faço  planos lentos.
Explico.
Sou sempre muito acelerada.
Pensamentos, palavras e ações.
Mas não tem dado certo.
Resolvi mudar.
E mudar como o vento, que é fluido e tudo preenche.
Resolvi ser maleável, como o vento.
Que não tem forma, mas está  presente.
Então,  desfilei calma, passos firmes.
Cabeça erguida.
Sou vento forte.
Sou forte.
Sou.
E pensava nos meus planos lentos.
Quero ter calma, desfrutar a vida.
Agora, cada segundo conta.
Quero aproveitá-los todos.
Para mim. De mim. Comigo.
Nesses planos lentos,
Cabe um olhar distante,
Cabe um beijo quente,
Cabe passear de mãos dadas,
Cabem conversas sem fim,
Cabem sorrisos de mim,
Cabem suspiros assim:

... ... ...

Meus passos são firmes,  decididos,
Mas são fachada de um coração
Mole, bobo, sonhador.


quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Coleção de beijos...

Do meu amor, quero uma coleção de beijos...
Coisas boas de pensar
Quero aquele sorriso lindo, quero um abraço longo
Eu vou dar aconchego, vou dar meu colo, vou dar carinho
Quero dar o melhor de mim
Vou dar confiança, respeito e leveza
Vou aprender o que eu não souber e vou estar presente
Do meu amor, quero a paz e o desejo
Quero aquele peito largo, para eu poder recostar
Quero respirar livre, suspirar
Eu vou dar a minha mão para uma caminhada
e minha disposição para andar ao seu lado
Do meu amor, quero a voz doce,
Falando meu nome para eu poder despertar
Eu vou dar a minha presença, a minha constância
e a hora certa em que vou chegar
Do meu amor, quero momentos - um de cada vez - já que ele ainda não está inteiro
E eu vou beijar os seus olhos para que aquelas dores passem
E eu vou me dar por completo
E eu vou segurar a sua mão
Do meu amor, quero no mínimo um beijo e no máximo um amor para a vida inteira
 - e tudo o que couber nessa gradação
O meu amor não quer me decepcionar e não quer que eu crie expectativas
E eu o quero ainda mais por isso
Eu vou aprender a esperar
O meu amor às vezes é triste, e alegria eu quero dar
O meu amor me conhece pouco e ainda receia chegar
Eu vou dar o tempo de que ele precisa para poder se recuperar
Do meu amor, quero uma coleção de beijos...
coisas boas de experimentar


sábado, 15 de outubro de 2016

O fotógrafo

Era início dos anos 70 e o menino tinha apenas 8 anos. Nem ele mesmo

sabia, mas já era um fotógrafo de mão cheia. Digo, de visão cheia.

Contemporâneo de Glauber, sem sequer conhecê-lo, compartilhava daquela

máxima romântica: uma câmera na mão e uma idéia na cabeça.

Com a maquinazinha ganhada no aniversário de 14 anos, o menino de short e

sem chinelos andava pela parte velha da cidade. Andava pela beira do rio,

andava pelas mangueiras, andava pelos lados da rodoviária e da ponte (será

que já existia a ponte?) e clicava tudo o que lhe chamava a atenção.

Na viagem para Porto Seguro, com os colegas da oitava série, estilo bate-e-

volta, lá foi ele com a pequena câmera a tiracolo. Fotos P&B, quadradinhas,

com as bordas repicadas, bem ao estilo da época, fizeram a reportagem

daquela viagem histórica. Garotos e meninas com calças boca de sino e batas

coloridas tiveram a alma e os sorrisos arrebatados em sépia, no qual se

reconhecem retratados até hoje.

Teria sido ali traçado o seu destino? Ele já teria a visão de seu futuro? Seus

horizontes se ampliariam como numa panorâmica?

Mulheres novas e velhas, mães trabalhadeiras, artesãs amassando o barro e

aquecendo o forno, rezadeiras, mulheres plantando e colhendo, lavadeiras da

beira do rio, escrevinhadoras de biscoito povoam o olhar desse menino.

Assim como as crianças, muito sorridentes, curiosas, jogando bola, empinando

pipa, correndo atrás dos cachorros e das galinhas, brincando com bonecas

quebradas, fazendo boizinhos de ossos, fazendo rolar latinhas velhas de

goiabada... crianças em grupo - saindo do grupo escolar - crianças com pureza

no olhar e que se transformam pelas lentes do menino.

E os homens? com seus chapéus de feltro tentando se proteger do sol,

enrugados, parecendo mais velhos do que são, cavalgando,

tropeirando, tocando seu gado magro, na lida, plantando o feijão no pó...

garimpando, arando, fazendo seus cigarrinhos de palha, vendendo seus

produtos no mercado, jogando cartas, tomando suas cachacinhas nas budegas,

lá pros lados do seu Lidirico...

Os personagens do menino são muitos, mas são um só. Os personagens e o

menino são feitos do mesmo barro daquele vale e a um só tempo se

transformam no imaginário coletivo de todo um povo sertanejo e

redundantemente forte.

Deve ser por isso que o menino não aguenta a lonjura, a distância. Deve ser

por isso que o menino quer voltar. Deve ser por isso que o menino se perde

nas ruas grandes da cidade... Que é do menino franzino de short, saindo da

boleia e divisando o futuro?

O menino é o fotógrafo que olha o mundo por um quadradinho; que tem,

aparentemente, uma visão limitada. Mas quando ele nos deixa ver o resultado,

como se amplia! Como se agiganta o menino!

****

Escrevi este texto há uns cinco anos, mais ou menos, mas nunca o dediquei a quem devia... Apesar de ter inúmeros amigos fotógrafos (sintam-se todos homenageados!), este texto é dedicado a um único fotógrafo, que já foi muito importante na minha vida, com quem eu aprendi a olhar a vida de muitos modos, de vários ângulos, sob inúmeras perspectivas... e vou ser sempre grata, apesar de tudo, acredite!

O Dia do Fotógrafo é comemorado em 08 de janeiro, mas pra mim, vai ser sempre no dia 17 de outubro. E que comecem os festejos!!!!! Para O.F., com carinho!

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Mestre Álvaro

O Mestre Álvaro é um maciço granítico, com 833 metros de altitude, de onde se pode avistar toda a região metropolitana de Vitória, além das cidades vizinhas e o Oceano Atlântico.
Durante séculos, os grandes navegadores e as pequenas embarcações têm se guiado por ele. Há citações cartográficas desde o século XVI. E eu vejo o Mestre Álvaro, todas as manhãs, da minha varanda. Ora nítido ora envolto em nuvens ele está lá, me guiando, me dando um norte. 


Tenho acordado cedo, bem cedo
Posso olhar o parque e ouvir os pássaros
Posso olhar ao longe e refletir
Posso respirar e ter calma
Posso pensar na vida e dar paz ao meu coração
Posso ver o Mestre Álvaro enevoado
Posso pensar no ciclo da vida
Recomeços - com medos e avanços
Confiante - mas sem expectativas
O dia a dia
Posso observar uma florzinha nova, uma folha caída
Posso cheirar o ar
Respirar a vida,
que renasce e floresce
Posso me sentir feliz nessas pequenas coisas
E grata
Por isso é bom acordar cedo
e acordar para a vida
Posso confiar em mim
Posso acreditar em mim
E eu gosto
Aprendi a gostar
Aprendi a desfrutar

Meu lar é onde avisto o meu guia... eu sigo em sua direção e não estou mais perdida. O Mestre Álvaro me chama de volta pra casa e posso fincar os pés no chão.


domingo, 2 de outubro de 2016

Pedra, papel e tesoura...

Why did a fucking boy called me a baby and a man who I desire cannot see me?

É com pensamentos como esse que tenho que lidar - e não sou apenas eu - e isso é o que me consola.
Quem mais tem o seu coração partido, queimando, diariamente, sem saber o que fazer e como conseguir rodar o dia?
Quem mais vive e respira pisando em nuvens, enquanto interage com máquinas?
Quem mais tem a alma frágil, esgarçada, enquanto sorri ao executar suas tarefas?
Quem mais se exaspera com o momento político, mas tenta se sentir acalentado com o bom da vida?
Quem mais faz as contas do fim do mês fecharem, enquanto realiza pequenos milagres diários?
Quem mais precisa ser duro em casa, no trabalho, nas suas decisões, enquanto bastaria apenas um colo e um afago?
Quem mais se estressa com uma correria sem fim, enquanto gostaria de andar a passos lentos, em uma slow life constante?
Sou apenas eu?
Quem mais ama sem ser amado?
E é com pensamentos assim, mixados de dor e esperança, que eu sigo.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Rebirth

Relatos
30 dias e vivi uma década.
Neste mês, vivi mais que em outros tempos...
Muita coisa mudou. 
Muita coisa mudei. 
Dentre as experiências, 

Rebirth.

E sou grata.
 Hoje, contemplando os prédios da avenida,
pude sorrir, vendo as outras pessoas. 
Eu escolhi estar aqui.  
Eu decidi estar aqui. 
Uma ponta de vaidade surgiu em mim, 
por estar onde quero e pelo sucesso. 
 No começo do mês eu me apaixonei duas vezes.
Uma pelo outro, outra por mim.
 Já havia me sentido assim, é claro.
Mais de uma vez, até.
Mas é sempre, é sempre diferente e melhor agora.
E quero me sentir assim de novo e mais vezes.
E quero me sentir assim sempre. 
Quero ter vontade de rir na rua a ponto de ter que disfarçar o riso solto quando alguém caminhar na minha direção... 
quero me sentir leve, flutuando em algodão,
ao dar minhas passadas de encontro ao amado..
quero me sentir linda, feromonizada, pupilas dilatadas... 
quero que todo o meu corpo fale em voz alta, 
porque minha boca, 
minha boca apenas vai murmurar no ouvido dele... 
e o tempo irá parar de novo. 
Ao me apaixonar pelo outro, 
eu me apaixonei por mim mesma de novo. 
E foi bom! 
Fazia tempo que não me sentia assim, muito tempo.
Eu me senti forte. 
Eu me senti leve. 
Eu me senti livre. 
Eu me senti linda. 
Eu me senti melhor. 
Eu me senti mulher. 
É bom saber disso.
É bom crer nisso. 
É bom acordar bem. 
De bem.

Mas  –  e tinha de haver um mas? – e se durar pouco... se durar nada perto da minha sede... se durar um intervalo de tempo entre a dúvida, a certeza, a dúvida de novo e a certeza de novo?
Vou restar forte, quedar-me de pé, mas querendo ser fluida, querendo ser lágrima, querendo ser gozo, querendo perdurar essa sensação.

birth  -  rebirth   -  a vida que tive  -  a vida que tenho  -  a vida que quero 

 a vida  


quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Amores

Eu já tive um amor para quem eu escrevia:
Comprar o pão,  pagar as contas...
E esse amor parou de ler os meus  bilhetes
E isso destruiu aquele amor

Eu já tive um amor para quem eu me dedicava:
Fazia o pão, sanava as contas
E esse amor parou de de mim se ocupar
E isso destruiu aquele amor

Eu já tive um amor para quem eu me cuidava:
Evitei o pão, não pensei nas contas
Mas esse amor parou de me notar
E isso destruiu o meu amor

Eu já tive um amor para quem eu pouco me lixava:
Pão? Contas? Nem era amor!

Eu já tive um amor com quem eu sonhava:
Ah! E o que eu mais queria era falar bobagens naquele ouvido!
Queria sentar no seu colo e falar bem de mansinho
Tudo, tudo, tudo, tudo o que eu iria fazer
Queria falar de mim e do meu desejo sem fim
E não vou contar mais nada
pra deixar todo mundo curioso!



segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Minha prima é escritora

Não de verdade. Não sempre. Mas por um período pequeno de sua vida, minha prima exerceu o ofício de escritora. Narradora epistolar, mais precisamente.

Várias décadas atrás (eu nem tinha cinco anos) meus pais e eu nos mudamos para uma cidade do interior. Durante doze meses seguidos, semana após semana, minha prima nos escreveu cartas. 

Recentemente, minha mãe, ao "destralhar" deparou-se com envelopes esparsos, daqueles, verde-amarelos, cujo remetente ainda constava a antiga Rua Jardim Tropical... ainda rua de terra, na qual o carteiro nem ia. 

Escrever naquela época dava um trabalhão danado... as pessoas tinham de ir até os Correios, levar e buscar suas cartas e encomendas. Pois bem, em vez de "destralhar" aquilo tudo, minha mãe juntou uma a uma essas cartas e colocou-as em ordem. Surpresa: o relato familiar de um ano inteirinho.

Na ocasião, a família toda não passava de umas 15 ou 20 pessoas... imigrantes que somos, justapostos uns aos outros, sempre moramos juntos, vizinhos. E o fato de três de nós se afastarem significou alguma coisa. Bem, pelo menos gosto de pensar assim. Os motivos dessa mudança? Nunca soube. Mas isso já é tecido para outra história... e nem importa mais.

O caso é que minha prima escreveu. Sua narrativa é clara, límpida, objetiva e direta. Sem nenhuma nem qualquer intenção, esses textos, ora datilografados ora na sua letrinha miúda de adolescente dos anos 70, relatam fatos tão corriqueiros quanto importantes.... para mim...

Minha prima escritora contava as coisas que tinham ficado: como tinha sido seu dia na escola, o que iria comer no almoço, quem havia ficado doente, por quantas horas o telefone havia ficado mudo, qual era a novela da época, qual parente distante havia se mudado, qual a cor do casaco novo, e mesmo expressões que até hoje ela usa, assim tipo:"paciência!", enfim, tudo o que lhe viesse à mente e mais tudo quanto meus avós, tios e primos lhe pedissem para contar. Fatos corriqueiros, dotados, porém, de uma importância visceral. 

Minha avó devia ser muito ocupada, pois sempre mandava lembranças e dizia que não tinha tempo. Meu avô era incumbido de levar as cartas e ficava pressionando para que ela acabasse de escrever logo... punha seu fusca branco a funcionar e lá ia o BB7012... fazendo fumaça, levando histórias. 

Quando eu me deparei com esse pequeno tesouro íntimo, ficou na minha cabeça uma névoa. Eu, que sempre me senti "tantas vezes reles, tantas vezes vil", assim como o Pessoa; eu, "que tenho sido uma fraude em tudo", também assim como o Pessoa, eu, que me queria escritora desde sempre e não o fui... por que esperar mais? Quais propósitos eu espero? Quanto mais de mim eu vou ter que ler em vez de escrever? Por isso - e uns outros tantos fatos também - resolvi continuar. Resolvi assumir agora essa escrita, afinal, venho de uma família de escritores...



sábado, 17 de setembro de 2016

Todo dia

Eu vou correndo de braços abertos
Só pra te abraçar
Minha boca só te quer
Só te quer beijar
No meu caminho eu penso em você
Eu vou correndo
Olhando o mar
Eu saio correndo  à noite
Pra te encontrar

A noite é  escura agora
Agora que eu não tenho a certeza de te encontrar

Mesmo assim saio correndo à noite
E minha boca só te quer falar
Que em meus sonhos
Você vem
Você vem me amar

Minha boca só te quer
Só te quer beijar

Meu corpo só te quer
Só te quer amar

Meu peito

Neste momento,  ligo a função  retro do aspirador.
Pelo mesmo furo fino de punção, por onde entrou tanta mágoa, acumulada durante anos, sai, agora,  por uma cânula grossa, toda a toxina de minhas lembranças transmutadas.
Saiu o sangue e saiu o fel, e por isso me sinto assim, diferente.
Mas ainda não saiu tudo, estou em processo, está saindo em forma de palavras.
E elas estão amarradas uma a uma, longa corrente encadeada, tecida e retorcida nas minhas memórias.

Meu peito.

É nele que sinto as palavras saindo.
Umas puxando as outras para que eu possa me sentir leve, livre, outra.
E mesmo que elas - ainda - não digam nada,  esclarecem muito de mim para mim.
Elas me desentopem.
Elas me desobstruem.
Elas me salvam.
Tenho que gastá-las muito.
Deixá-las sair para que eu possa chegar ao centro de mim, ao que de mim se mostrará primal.
Ainda vai levar um tempo.
E eu vou puxá-las todas com muita força,  até  que eu me sinta satisfeita e feliz,  porque se eu não me esvaziar de mim, eu não vou mais aguentar.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Papel novo

Tenho abraçado  cada vez mais o teu travesseiro na cama, enquanto te espero chegar

Tenho tomado café da manhã sozinha, enquanto te espero acordar

Tenho ido cada vez mais à  praia aos domingos, enquanto espero  o sol se firmar

Tenho pensado em nós cada vez mais, enquanto  tenho tempo para imaginar

Tenho gostado de quem não me merece

Mas, ai,  como tenho me divertido!

Tenho reclamado de que tenho envelhecido

Mas é como tenho me sentido melhor

Tenho, tenho, tenho

Tenho tudo tenho nada

Mas quando tenho nada é que tenho tudo

Tenho um papel novo para começar

Nada de dizer que "eu não sei dizer"

Nada de dizer "então eu escuto"

Então eu falo mesmo. Já  foram muitos anos calando

Tenho mudado cada vez mais nestes anos todos, enquanto me espero chegar

E tenho gostado de mim

Quero abraçar cada vez mais o teu corpo na cama.

Deixa este travesseiro pra lá




Meu carinho, meu enorme carinho, vai para W.


Já gastei muitas canetas, cadernos e folhas.
Já escrevi no ar, na areia e na poeira ( aos seis anos de idade, quando quis fugir de casa e deixei um recado no criado-mudo ).
Já escrevi pensando, cantando, orando, mentalizando. 

Mas nunca me senti tão motivada quanto agora, incentivada por meu amigo W.

Sabe aquelas pessoas que a gente tem pouco contato, que é amigo do seu amigo e que, por acaso, gosta de você? Então, W. é assim. Nosso contato é muito pequeno, mais pela distância e pela falta de oportunidade que por falta de afinidade, imagino. 

W. é amigo e companheiro de minha amiga D. 

Acho que pelo fato de eu ter passado quase dois terços de minha vida compartilhados com D., W. tem um carinho por mim, deve ter, não é possível que meu nome não seja citado naquela casa pelo menos.... bem, deixemos isso de lado, o que importa é a qualidade. 

Enfim, dessa amizade ficou uma grande saudade! Sempre que vou para sua cidade, eu me empenho em vê-los. 

Num desses dias, W. me perguntou porque eu não escrevia... ou seja, porque não colocava em prática essas palavras soltas, voláteis. Por quê? Por quê? Por quê?

E eu não soube responder... me senti mole, amorfa. Mas também me senti desafiada. 

Demorou um mês para eu ensaiar este começo. E aqui estou.

No fundo, no fundo, não preciso de pretexto. O que me impulsiona pode estar em qualquer lugar, ao meu lado ou longe, de modo bem simples ou dolorido, bebendo ou não, acompanhada ou só.

Meu carinho vai para W., que me fez querer responder à sua pergunta. SEXTA-FEIRA, 1 DE OUTUBRO DE 2010.

Esse texto foi escrito há seis anos! Está muito perto de fazer seis anos! Nunca me senti tão feliz por estar errada e certa ao mesmo tempo. Errada porque aquele pouco contato, aquela intimidade frágil, aquele acaso não existe mais... certa porque aquele carinho só aumentou, e se transformou em convivência mútua, em cumplicidade, em uma afinidade sem tamanho.

Feliz em saber, mais uma vez, que posso contar com esse amigo, com esses dois amigos queridos, entre tantos que me dão mostras de carinho gigantescas todos os dias... e mais uma vez, o recomeço, mais uma vez o apoio, imensurável que W. pode, quer e sabe me oferecer...

Meu carinho, meu enorme carinho vai para W.


Para Wlad Pieroni, que deu vida e cor ao meu "fruto" por duas vezes.

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Nasceu o Fruto da Pitangueira

O Fruto da Pitangueira nasceu das minhas mais profundas lembranças.

Eu morei na Rua Alfa, número 226-A, no bairro Moinho Velho, em São Paulo, durante dez anos. Posso afirmar, com certeza, que foi a pior casa em que já vivi. Muito antiga, tinha sido a primeira construção que meu avô fez para viver com a família, assim que vieram de Portugal, nos idos de 1946.

Uns quase trinta anos depois, minha mãe já adulta, casada e com filhas, precisou da casa para nela morar comigo e com meu pai. A casa havia sido dividida ao meio, literalmente, de modo que havia se tornado gêmea de uma outra igualzinha, porém espelhada. E isso fez com que a casa tivesse um estilo esdrúxulo, tipo corredor, explico: um quintal à frente, com alpendre na entrada pela sala, seguida por um quarto, seguida pela cozinha, com o banheiro ao fundo, tudo em linha reta, encadeado, e um grande corredor externo lateral. 

Para esse corredor, pendiam os galhos da Pitangueira da Dona Aurora, a vizinha de fundos, da outra rua, já que a casa era de esquina. E, debaixo desses galhos, passei dez anos de minha infância e adolescência, dos 6 aos 16 anos, saboreando "O Fruto da Pitangueira"...

Apesar de a casa ter sido horrível (e me lembro muito bem, porque antes dessa já havia mudado umas quantas vezes de casa, bairro e cidade e aos seis anos já tinha uma excelente memória, inclusive dos dois anos passados em Barretos, cidade de meu pai e dos De Santis da famíla), bem, apesar de adorar frisar que a casa era e foi realmente horrível, rsrsrsrsr, tinha lá uns encantos diferentes: ao final do corredor, na direção de quem iria para a rua, do lado direito se abria uma espécie de galpão, fechado com treliça de madeira pintada em tom de verde água que guardava...o que mesmo? Era um espaço cimentado, cimento queimado, piso muito liso, no qual eu brincava com todos os meus pertences e imaginação. E, anexo à casa, havia o quintal do meu bisavô, que morreu logo em seguida à nossa mudança, e passou a ser o quintal do meu avô. Esse espaço, sim, era um reino encantado para mim. Um espaço verde, de mato, onde ele cuidava de uns patos, galinhas, uns coelhos e uns curiosos pés de fumo que nem sei pra que serviam, se ninguém fumava naquela época. 

As crianças da família se divertiam com os coelhinhos, patinhos e pintinhos pequenos e lindos e, claro, arrancando folhas e flores para nossas brincadeiras, enquanto meu avô retirava ovos para as abomináveis gemadas que tinham poderes fortificantes. E esse foi o único encanto da casa: o seu externo.

À sombra da pitangueira, naquele corredor, durante milhares de vezes, eu e minha cachorrinha nos sentamos para brincar e conversar. Eu me lembro bem! E talvez, ou muito certamente, foi saboreando o fruto da pitangueira que adquiri o hábito de falar sozinha, cultivando as palavras e as ideias, visto que meus pais adultos não eram muito do tipo de brincar e dar vez e voz às crianças, além de não ter sido criada junto com a minha irmã, por outro esquisitíssimo costume da época, o de deixar os filhos primogênitos aos cuidados dos avós, quase como que a lhes ceder uma criança de companhia.

Não falo isso com mágoa e nem terei problemas com minha mãe, que já se acostumou com a ideia de ter sido constantemente questionada e bombardeada para que nos explicasse seus motivos. Ela sempre respondeu a mim e à minha irmã que eram costumes de uma outra época, pois como minha irmã havia nascido no inverno de São Paulo, realmente rigoroso naqueles tempos, quando minha mãe ia buscá-la na casa dos meus avós, eles diziam: "deixa a menina, que já está a dormir", e a menina ficava... fora isso, meu avô era louco com crianças, principalmente com a primeira neta. E a menina ficou para quase sempre.

Mas como estava contando inicialmente, debaixo do galho pendente daquela árvore é que nasceu a minha imaginação e é por isso que esta história tem este título, ou mote, não sei bem, que marcou meus bons e maus momentos ao longo de dez anos de minha jovem vida e, de certa forma O Fruto da Pitangueira, este texto e este blog, tem o tom destas memórias, que se tornaram fantasias e sonhos e me ajudaram a saborear o meu mundo de forma tão tropical e exótica, e permitiram que eu voasse para bem longe dali, anos depois, acumulando todos os tipos de sensações para que futuramente eu as pudesse transformar em palavras.

A pitanga, palavra que em Tupi antigo, redundantemente, significa fruto redondo e vermelho, é uma planta nativa da Mata Atlântica brasileira, rica em vitamina C e cálcio, exuberante no seu aroma e cor, e que atrai pássaros e insetos silvestres, além, é claro, de ter atraído para junto da Pitangueira da Dona Aurora aquela menina que até hoje sente o aroma  daquele fruto e hoje está aqui para escrever.

Eu, realmente, com todas as minhas forças de menina, odiava aquela casa, a vida naquela casa, "chorei muitas das minhas pitangas" naquela casa, mas também aprendi a amar as pitangas, contrariando o dito popular.

E o tempo passou, eu me mudei umas tantas outras vezes, de casas, bairros, cidades, e senti vontade de escrever. Simples assim. Como uma pitanga cheirosa e vistosa.

CARTA DE AMOR PARA LINIKER, por Cilene De Santis

Hoje começo novo ciclo e confesso novo vício. Doce e quente. Meu novo vício é Liniker. 

Preciso me apresentar para poder me explicar e ao mesmo tempo perguntar como pode isso acontecer? Sou apenas alguém comum, mas tenho sonhos e desejos e quando ouço a voz de Liniker, não sei se é sua voz, sua figura, o som do metal ou tudo junto. Uma paz enorme invade o meu coração e uma vontade de mostrar ao mundo que não sou um estereótipo. 

Eu aceitei o convite. Estou totalmente bagunçada. Estou falando de Zero, a música. De Zero, o meu ponto inicial. E vim chorando nos 900 m que separam o ponto de ônibus de minha casa, onde escrevo agora nesta escrivaninha idealizada para pensar e escrever meu novo futuro... 

Sim, estou bagunçada e com alguém em mente para bagunçar. E fiquei mordida! 

O que é esse menino! Que vontade de abraçá-lo! O que é a minha vida se não o mais normal de nós? Tão vasta e tão pequena e sou uma e sou muitas e mesmo assim, por vezes, me deixo abater por apenas uma versão de mim... 

Sim, estou completamente bagunçada e mordida! E é aqui que entra Liniker e os Caramelows, Liniker e o metal, Liniker e sua voz, Liniker e sua coragem simples, pura, genuína. 

A forma como sorri quando canta transmite a paz e o desejo que quero manter. Que quero mostrar quando chegar a hora. O seu prazer quando canta me dá segurança e diz que é assim que quero me sentir na vida. E não tenho mostrado isso. E tudo o que canta não é fração daquilo que quero escrever. 

Porém, o mais engraçado, é que cabe - tanto para ele como para mim - cabe tudo na malinha de mão do meu coração.

 Agora sei que estou pronta. Deixa eu bagunçar você?