sábado, 17 de setembro de 2016

Meu peito

Neste momento,  ligo a função  retro do aspirador.
Pelo mesmo furo fino de punção, por onde entrou tanta mágoa, acumulada durante anos, sai, agora,  por uma cânula grossa, toda a toxina de minhas lembranças transmutadas.
Saiu o sangue e saiu o fel, e por isso me sinto assim, diferente.
Mas ainda não saiu tudo, estou em processo, está saindo em forma de palavras.
E elas estão amarradas uma a uma, longa corrente encadeada, tecida e retorcida nas minhas memórias.

Meu peito.

É nele que sinto as palavras saindo.
Umas puxando as outras para que eu possa me sentir leve, livre, outra.
E mesmo que elas - ainda - não digam nada,  esclarecem muito de mim para mim.
Elas me desentopem.
Elas me desobstruem.
Elas me salvam.
Tenho que gastá-las muito.
Deixá-las sair para que eu possa chegar ao centro de mim, ao que de mim se mostrará primal.
Ainda vai levar um tempo.
E eu vou puxá-las todas com muita força,  até  que eu me sinta satisfeita e feliz,  porque se eu não me esvaziar de mim, eu não vou mais aguentar.

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